Cuidadores informais reivindicam apoio e capacidade de resposta ao Estado português
Num país em que “80% dos cuidados prestados a pessoas dependentes é feito por pessoas não formadas e sem remuneração”, expostas aos riscos de situações de pobreza, isolamento, ansiedade e depressão, emerge a urgência de debater as principais preocupações dos cerca de “800 mil cuidadores informais de Portugal” e o papel do Estado português perante a necessidade de implementar uma rede pública que dê apoio e resposta prontamente ao cuidador informal e à pessoa cuidada. As palavras proferidas pelo presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos (SRCOM), Carlos Cortes, impulsionaram o debate do colóquio organizado em parceria pela Associação Portuguesa para Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental (APPACDM) de Coimbra, subordinado ao tema “Cuidadores (In)Formais: proteger quem cuida”, que preencheu a sala Miguel Torga na manhã do dia 14 de março.
O evento, dividido em três momentos, contou com a primeira intervenção de Carlos Cortes, que relembrou que”o cuidador abdica, muitas vezes, do seu emprego” por ser incompatível com a “exigida dedicação total”. A necessidade de o “Estado Português dar mais atenção aos cuidadores informais” é uma problemática que a Presidente da APPACDM de Coimbra, Helena Albuquerque, assume não poder deixar de “contemplar no programa de comemoração dos 50 anos” da Associação que representa. A coordenadora dos Lares da APPACDM de Coimbra, Carla Ribeiro, finda a Sessão de Abertura da palestra com os votos de “que seja uma manhã de partilha”, de onde espera que todos saiam “mais esclarecidos”.
A segunda comunicação do Colóquio foi dirigida pela advogada Filomena Girão que abriu espaço para uma visão jurídica, abordando os desafios legais para os cuidadores informais, os quais passam, de grosso modo, pela implementação de “uma rede pública de apoio ao cuidador informal e à pessoa cuidada”. “Abdicar desta informação é um erro muito grosseiro porque todos nós, eventualmente, seremos cuidadores ou pessoa cuidada”, sublinha a oradora.
A opinião de Filomena Girão é partilhada pelo presidente do Conselho de Administração do Hospital Distrital da Figueira da Foz, Manuel Teixeira Veríssimo, que retoma como uma das principais medidas a implementar “uma rede articulada que dê apoio e resposta prontamente” ao invés dos “projetos-piloto que não têm capacidade de resposta”. No seu discurso, Manuel Veríssimo afirma que “o problema do cuidador informal é transversal” e que “as respostas não podem ser isoladas”, havendo, cada vez mais, a necessidade de “formar os jovens para responder melhor mais tarde através de, como indica, formações que também ensinem “os cuidadores a lidar com os problemas do dia-a-dia das pessoas cuidadas”.
Em conformidade, Rita Joana Pinheiro Maia, membro da Associação Nacional de Cuidadores, vai mais longe e, numa crítica ao Estado que “insiste em não assumir o estatuto”, reivindica pelo mesmo através da produção de uma “legislação que preveja o regime de trabalho com redução de horário laboral em 50% para os cuidadores laborais sem perda de vencimento”.
A palestra contou, de seguida, com uma Mesa Redonda de Testemunhos de cuidadores de doentes de Alzheimer e Esclerose Múltiplas e de pessoas com deficiência ou paralisia cerebral. De entre os relatos o público foi confrontado com a declaração de Ivo Quintas. “Eu sou cuidador, a minha mulher é cuidadora, a minha mãe é cuidadora”. “A vida fica-nos hipotecada”, completa Carmina Neves, funcionária da Universidade de Coimbra que, relembrando as consequências para o cuidador informal, afirma ainda ter chegado “a uma exaustão, algumas depressões”, o que também aconteceu com Judite Rafael, membro da Sociedade Portuguesa da Esclerose Múltipla, que teve “que recorrer a uma psiquiatra”. No decurso dos testemunhos, também António Viegas assume ser tempo “de o Estado sentir que é responsável” já que “não se preparou para o envelhecimento da população e para os deficientes”.
O Colóquio findou com um conjunto de comentários finais que retomaram o conceito de rede como resposta à “desarticulação absoluta das tutelas nesta matéria”, associados à necessidade de formações que combatam a “desinformação instituída”.